Alfredo Margarido – Elogio do ‘bidonville’, in Latitudes, n°5, Avril/Mai 1999, p.14-20Alfredo Margarido – Elogio do ‘bidonville’, in Latitudes, n°5, Avril/Mai 1999, p.14-20

« Não sabemos ainda onde será mais alegre : se aqui nas barracas a beber uns copinhos e com umas cantaroladas toda a noite, se naqueles alojamentos bonitos a falar baixinho para não incomodar os franceses. » (Fala recolhida por Adelino Gouveia, in Diário de Notícias, dez. 1970 ; página redigida por emigrantes portugueses em França) (p.18)

« […] Uma parte dos emigrantes carrega consigo as condições culturais do campo português, que não só não possui nem tradição nem cultura urbanas, mas nem sequer conhece muito bem as diferentes funções do Estado. […] (Regista-se) durante a primeira fase da vida em França e particularmente em Paris, a necessidade de uma forte coesão, única maneira de assegurar a transferência de uma sociedade eminentemente rural, para uma metrópole urbana como sempre foi uma cidade como Paris. O génio português não reside na exaltação da saudade, como ainda se pretende, mas antes na capacidade de adaptação a condições sociais e a tarefas técnicas que não pertenciam ao sistema dos valores rurais portugueses.

É nestas condições que podemos registar a intervenção, quando não a invenção do ‘bidonville’. […] sistema de urbanização da colectividade : o grupo assegura desta maneira a sua autonomia, face à sociedade dominante, que os sociólogos teimam em designar como sendo ‘la société d’accueil’, a sociedade de acolhimento, quando na verdade, e quase sempre, se trata da sociedade que repele ou rejeita. Compreende-se por isso que o gueto, de que o bidonville é uma expressão moderna, possa surgir como solução adoptada pelos emigrantes, perante as condições que lhes são oferecidas pela sociedade onde sobretudo pretendem trabalhar. » (p.15-16)

Traduction : “Nous ne savons pas encore ce qui est plus gai : si c’est ici, dans les baraques, en buvant des coups et en chantonnant toute la nuit, si c’est dans ces beaux logements, où il faut parler tout bas pour ne pas déranger les Français. » (Dires recueillis par Adelino Gouveia, in Diário de Notícias, déc. 1970; page rédigée par des immigrants portugais en France)

[…] Une partie des émigrants transporte avec eux la culture rurale portugaise ; non seulement ils ne possèdent pas de tradition ni de culture urbaine, mais ils ne connaissent pas vraiment les différentes fonctions de l’Etat. […] (On enregistre) durant la première phase de leur vie en France et particulièrement à Paris, le besoin d’une cohésion forte comme seul moyen d’assurer le passage d’une société éminemment rurale vers une métropole urbaine comme Paris. Le génie portugais ne réside pas dans ‘l’exaltation de la saudade’, comme on continue de prétendre, mais plutôt dans la capacité d’adaptation à des conditions sociales et à des tâches techniques qui n’appartenaient pas à l’univers rural portugais.

C’est dans ces conditions qu’on enregistre l’intervention, sinon même l’invention du bidonville. […] système d’urbanisation de la collectivité: de cette manière, le groupe garantit son autonomie face à la société dominante que les sociologues persistent à désigner comme étant la « société d’accueil », alors qu’en vérité il s’agit, presque toujours, de la société qui repousse ou qui rejette. On comprend ainsi que le ghetto, dont le bidonville est une expression moderne, puisse surgir comme solution adoptée par les émigrants face aux conditions qui leur sont offertes par la société où ils prétendent surtout travailler. » (p.15-16)

Observations:

Alfredo Margarido fait partie de ces intellectuels portugais qui, pour des raisons politiques, ont longtemps vécu à l’étranger. Auteur d’une œuvre multi facettes et à contre-courant, Alfredo Margarido est avant tout un libre penseur concerné par les problèmes de société et leurs questions affines, ethnologiques, anthropologiques, culturelles. Le numéro que lui consacre la revue Latitudes (n° 24, septembre 2005) permet de découvrir l’étendue des domaines explorés par l’auteur. Durant son exil à Paris, où il arriva en 1964, Alfredo Margarido fut un des rares intellectuels portugais à prendre position par rapport à l’impressionnant flux migratoire qui allait caractériser les années 60. Mais il fut, surtout, un des rares à ne pas porter un jugement sur ses compatriotes qui vinrent aider à peupler les quelques 170 bidonvilles existant alors aux alentours de Paris. Tout en portant un regard critique sur les politiques portugaise et française à l’origine de cet exode et des conditions dans lesquelles il se déroulait, A. Margarido chercha, par ailleurs, à comprendre ce qui pouvait pousser les Portugais à résister au démantèlement des bidonvilles lorsque les autorités décidèrent leur résorption (lois Debré, 1964, et Nungesser, 1966).

A propos de la résorption des bidonvilles et des luttes menées par les habitants, voir le film « Lorette et les autres », tourné par Dominique Dante en 1973 (fiche disponible dans l’espace cinémathèque).

« Não sabemos ainda onde será mais alegre : se aqui nas barracas a beber uns copinhos e com umas cantaroladas toda a noite, se naqueles alojamentos bonitos a falar baixinho para não incomodar os franceses. » (Fala recolhida por Adelino Gouveia, in Diário de Notícias, dez. 1970 ; página redigida por emigrantes portugueses em França) (p.18)

« […] Uma parte dos emigrantes carrega consigo as condições culturais do campo português, que não só não possui nem tradição nem cultura urbanas, mas nem sequer conhece muito bem as diferentes funções do Estado. […] (Regista-se) durante a primeira fase da vida em França e particularmente em Paris, a necessidade de uma forte coesão, única maneira de assegurar a transferência de uma sociedade eminentemente rural, para uma metrópole urbana como sempre foi uma cidade como Paris. O génio português não reside na exaltação da saudade, como ainda se pretende, mas antes na capacidade de adaptação a condições sociais e a tarefas técnicas que não pertenciam ao sistema dos valores rurais portugueses.

É nestas condições que podemos registar a intervenção, quando não a invenção do ‘bidonville’. […] sistema de urbanização da colectividade : o grupo assegura desta maneira a sua autonomia, face à sociedade dominante, que os sociólogos teimam em designar como sendo ‘la société d’accueil’, a sociedade de acolhimento, quando na verdade, e quase sempre, se trata da sociedade que repele ou rejeita. Compreende-se por isso que o gueto, de que o bidonville é uma expressão moderna, possa surgir como solução adoptada pelos emigrantes, perante as condições que lhes são oferecidas pela sociedade onde sobretudo pretendem trabalhar. » (p.15-16)

 

Laisser un commentaire

Votre adresse e-mail ne sera pas publiée. Les champs obligatoires sont indiqués avec *